11 fevereiro 2009

Cânticos

I

Neófito,
A quem olhaste, quando, pela primeira vez, se abriram os teus olhos?
O deserto, a primeira coisa. O deserto foi a primeira coisa que tocou os teus olhos.
Néofito ! Sobre o que caminhas?
Quem te fornece a fome da qual extrais a voz dos anjos?
Quem é o teu pai?
O deserto.
E se o vendaval da noite rasga a areia
E, a areia engole o Sol no seu abraço incandescente
No seu oceano de gelo
Tu és o seu filho.


II

E neófito,
É na pedra que encontrarás exemplo,
Ela não cresce, não pode ser comida,
Nem mesmo bebida
Ela nada pede,
A pedra é perfeita
Como as coisas sozinhas podem ser perfeitas.


III

Meu neófito,
Consegues ver o cantil?
E agora o meu turbante?
O cantil não é um turbante
E nem o turbante procura ser cantil,
No mundo, cada coisa é o seu objecto.
Mas tu, tu pertences ao Anjo
E no mundo disfarçarás o cantil, o turbante,
O assassino, o curandeiro,
E todas as coisas roubadas.
Por isso, sempre que o Sol Nasce,
Deves subir a duna e sauda-lo
Porque o Sol se mascara de tudo o que a luz
Atinge, e não se divide.
Dorme então e sonha
A multiplicidade das formas,
Mas quando o beijo frio da Noite
Tocar a terra, vigía
E alimenta-te do silêncio da morte,
Só assim permanecerás no Mundo.


IV

E só, neófito,
Quando o cabelo prateado
Com que vieste à bruma
Se tornar fraco e quebradiço,
E o teu riso poderoso
Como o fim do uni-verso
E souberes de cor
Os segredos do vento
Deverás tu ensinar
Os filhos dos homens
E devorar os seus vícios
Na boca do deserto.

Mad Marx na Capital*

Chegamos ao futuro! The Future is now!
O terreiro voltou a ser terreiro
Com toda a areia importada do Saara.
Dos Pêlos do nariz da imitação do Pai Natal
A ciência clonou o último dos heróis
Que algures vagueia pela Capital.

Este Cristo flagelado, que tantos ódios despertou,
Deixou crescer a barba em memória
Do seu original e habita as ruínas do Carmo.
De amores pela tia, vencedora do último Turner,
Decidiu, á falta de capital, escrever o Capital, na capital.

Resultado: edições esgotadas e Capital só pra alguns!
Colóquios e pseudo-congressos ei-lo ressuscitado!

E serei eu MadMarxiliano? Talvez, desde que ao som de:
…WE DON’T NEED ANOTHER HERO!...

Heróis há muitos seus palermas!!!

(10.2008)

* União de Mad Max com Karl Marx. «Mad»=tolo, louco, doido, maluco. lol

Toxinas

Acordei hoje com as toxinas do mal
Todas concentradas no meu coração.
Com dificuldade respiro e nos meus
Olhos, vermelhos, a tua imagem jaz
Embaciada pelo pensamento que ontem
Me levou àquele espaço escuro e caótico
Onde as sombras e a morte trespassam
Todas as pequenas ilusões.

Concentradas num espaço mínimo
Sinto-as! tão apertadas, tão presentes
Que todo a meu desejo de ter-te
Aumentou como se das tuas mãos
Florice o ar que respiro, que a todo
O momento me fere os sentidos.
Respiro lentamente sentindo dolorosamente
Cada entrada de ar, cada sorriso perdido

As toxinas da dor concentram-se no meu
Peito e dele não procuram sair. Toxinas!

O Perfume

De Rosas, magnólias e lírios estou eu farto
Perfumes suaves e suaves imagens…

Aprendi com Sade e Bataille
A amar o Ordinário, o Cabrão e o Travesti
A amar a Cabra, a Vaca, e a Puta
Enjoa-me cada vez mais falsos moralismos

Trazei-me o Humano Corpo hirto
Ao corpo desse poema em toda a sua essência física
Com todas as imperfeições
Grandes narizes, caras desfiguradas, pêlos em todos os poros
Todos os odores pestilentos e líquidos viscosos…

E repartirei por vós o meu esperma azedo!

To Lord Elgin

Mutilador de Memórias
que preservaste a força de Fídias
hoje é o dia em que os
poetas digitais devoram o teu nome

...e recuperam das ruínas gregas a tua dignidade...

***

Tentei devolver todo o leite materno
a minha mãe mas não consegui
tentei vomitá-lo e espalha-lo
em paredes de Cimento
Tentei em vão retribuir
todos os olhares atentos
...Tentei mas não consegui

***

Lord qual das crinas de cavalo
tocaste com teus dedos poeirentos
que pés de cavalos os cascos
eram os teus
que cabelos de amantes desejaste
o corpo nu estendido do teu pajem
as mãos suaves do teu superior

Lord a boca de cavalo que relincha
relincha em teu nome

Condenável acção de retirar do berço
a ferros o filho de Atenas
mas Restituires ao Homem unniversal
a glória do belo em Platão.

(London 2.2.09)

Ao Zarolha

Malvada alma que me partiste Todo
tão grande é a dor no meu Pescoço
Tal chupão nele o deixaste

Recorda-me eternamente o tesão do teu ânus
que vagorosamente suspirava
Tal era a tua fome.

Malvada Alma que me mentiste
Tão grande o desejo de te bater
Pessoa como tu
era rechear-te
e Cozer-te o cu.

Malvada Alma que ao mar marinheiros
seduziste
Malvada

04 fevereiro 2009

Tábuas minhas

Cláudia Consciência

Balanço-me num vazio sem fim
Ao som desta música silenciosa
Os meus olhos só vêm negro
As minhas mãos tocam no nada
O meu corpo não acorda
Pela minha alma fui abandonada
Tenho tempo
Muito tempo
Um tempo perdido
Só a mim oferecido
Sei que lugar é este
Sei o que me aconteceu
Sei porque estou aqui
É esta a minha eterna morada
Feita de tábuas
E de mim!

Âmago da dor

Cláudia Consciência

O meu corpo sangra
Mas cura
A dor na minha alma
Essa perdura

Instante eterno

Cláudia Consciência

Dá-me um instante eterno
Dá-me uma parte tua
Aquece-me o corpo
Veste-me a alma
Despeja em mim o que és
Sem ti sinto-me nua

A Orgia de Basil Poledouris

Os homens quando são jovens
Buscam as unhas afiadas de uma
Feiticeira no meio de uma cabana
No meio do deserto. No meio.
A política é algo eternamente secundário.

Quando as peles se tornam flácidas
Esses mesmos homens tornam-se políticos, até por vezes
Senadores de um estado reputado qualquer.
(Governadores, senadores tudo vai dar ao mesmo)
A força do seu membro já não muda o rumo dos mares e
As belas feiticeiras com olhos super pintados de rosa eléctrico
Com vestes opacas brancas e véus translúcidas recordam solitárias
as noites que com esses homens passaram.

* * *

O rodopiar de sons eróticos sobre si próprio
Que giram e voltam a girar
Entra-nos vagorosamente pelos ouvidos ficando-nos na alma o desejo e nos deixar
Embriagar pelo cheiro de pétalas de rosas embebidas em sonos e fetiches exóticos
Onde as cobras habitam e procriam outras cobras.

Para todos os orifícios existiam dedos e mãos brancas
Todos os poros e aberturas são alvo de penetrações suaves
(A velocidade do movimento anatómico demora-se no seu sono)
Os cheiros a plantas exóticas de plástico abundam no espaço como se o espaço
Fosse todo o desejo de conter o universo sexual e animal.

Seios, pernas depiladas, algumas por depilar, outras peludas, vaginas, úteros inchados, tetas, vaginas e tetas e úteros inchados no meio o deus fálico da procriação. Seios e mais seios. Alguns testículos maduros, muitos imaturos, alguns inocentes testículos. Corpos sobre corpos, ancas sobre braços, braços entre pernas, braços nas pernas, braços dentro das pernas como se os úteros inchados acordassem na hora de dormir. Crianças à mistura, decrépitos e idosos sem cabelos brancos sob a camada de sanduíche criada pelo juntar de frustrações intimas.

Abundam os açúcares, e dos óleos e das chamas existem as sombras e os óleos existem para que os seios se cobrem de delícia.
Seios sem mamilos, mamilos sem seios curvos e flácidos.
Seios com pêlos escuros e com escamas de peixe e com peixe entre os pés
E o cheiro a sangue de penetrações bruscas no meio do cenário abundam

Movimentos que se repetem
O gemido,
lamentos dolorosos, soluços,
suspiros densos, chilidos e muitos vagidos.
Vagidos repetitivos.
Gemidos e corpos que ondulam metáforas simples
que encontram a satisfação dos dias.

Pandaretas , cetins translúcidos, almofadas e odaliscas disfarçadas de lobos com as patas no chão em cima das mãos
Músculos, braços musculados e inúmeras barras de chocolate criam os ventres masculinos.
Ímpetos masculinos que agitam outros ímpetos masculinos e se devoram ao som de gemidos procuram matar as comichões e sede dos corpos

O andamento agita-se por momentos
Os vagidos intensificam-se descontroladamente até aos uivos de lobos
Cada um tem o seu tempo a sua demora
As feiticeiras demoram no cavalgar das suas ânsias
O chão molhado absorve todos os fluidos

O Conter de velocidade
(O pensamento distrai-se com as futilidades quotidianas:
Comprar calças novas;
Pagar a luz;
Arranjar mais ganza;
futebol amanha…)

Recomeça um rodopiar
Rodopios intensos
Uma sobreposição, um desejo de conter num só copo todos os corpos.
Todos os corpos procuram o teu!
Um banho.
E todo o teu
O corpo
Revive o quotidiano escondido:
O amigo gay que se devora ao pequeno almoço, a vagina da tia que se acaricia ao fim da tarde, a ovelha que se procura no quintal do avô, o irmão mais novo que na calada da noite se masturba… todo o corpo procura contê-los entre os pelos púbicos semi nascidos após farta refeição.

* * *

Levanta-te, fecha os olhos e move a cabeça
Pró lado esquerdo e direito lentamente e movendo-te sobre ti mesmo entra na roda
Deixa que a tua vontade e sede se liberte na vivacidade de todos os movimentos
E tu mesmo fecharás com as tuas unhas afiadas o circulo musical que se criou

Terás sim antes demais que deixar crescer as unhas
Terás sim antes demais comer-te silenciosamente
E o chão molhado absorverá os teus fluidos